sexta-feira, 14 de setembro de 2007

Desmatamento na Amazônia: um balanço do governo Lula (2002-2006)



A queda de cerca de 30% nos desmatamentos na Amazônia brasileira pelo segundo ano consecutivo anunciada há alguns dias (confira) pelo governo federal representa um avanço importante no que se refere às ações de controle ambiental implementadas, principalmente a partir de 2004. Há uma reversão de tendência e certamente as iniciativas governamentais estão relacionadas com reduções que, mesmo localizadas, são significativas no cálculo total da devastação, como, por exemplo, no entorno da rodovia BR-163, no Pará, e no interior de algumas Unidades de Conservação (UCs) criadas pelo atual governo. Como bem coloca a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, ainda que o patamar atual de desflorestamento seja inaceitável, certamente sem as políticas em curso a situação seria muito mais grave.
Com a projeção de 13,1 km2 de desflorestamento na Amazônia entre 2005 e 2006 – calculada a partir das 34 imagens de satélites analisadas pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) até outubro – o acumulado ao longo da gestão de Lula (de 2002-2003 a 2005-2006) somará cerca 84 mil quilômetros quadrados. Número superior ao de todos os quadriênios que a antecederam.

A título de curiosidade, 13 mil km2 em um ano significam uma média de desflorestamento de mais de 36 km2 por dia, ou 1,5 km2 por hora, ou ainda 2,5 hectares por minuto. A exemplo das analogias futebolísticas que o Presidente Lula gosta de fazer, esses 13 mil km2 equivalem a cinco campos de futebol devastados por minuto, durante os 365 dias analisados. Em quatro anos, são 16,6 milhões de campos de futebol, o equivalente ao território da Áustria.

Nesses últimos quatro anos, o Brasil emitiu, a partir do desmatamento, 996 milhões de toneladas de carbono, o correspondente a quase US$ 5 bilhões, de acordo com preços conservadores. Entre agosto de 2005 e agosto de 2006, o desflorestamento na Amazônia foi responsável por mais de 60% do total de nossas emissões. O País emite 95 milhões de toneladas/ano de carbono com a queima de combustíveis fósseis.

Desafio

Em nota publicada em agosto de 2005, (veja), o Grupo de Trabalho (GT) de Florestas do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais pelo Meio Ambiente e Desenvolvimento (FBOMS) considerava legítima a comemoração do governo pela redução do ritmo do desmatamento, mas, ao alertar para os efeitos da crise do agronegócio, apontava a necessidade de manter a cautela e não diminuir a guarda.

Se levarmos a sério o tom da campanha presidencial de 2006, marcada pela obsessão do crescimento do PIB acima de tudo e temperada pela necessidade de enxugamento da máquina e dos gastos públicos (incluindo comando e controle ambiental?), teremos no próximo mandato um desafio muito maior do que a simples reversão da curva do desflorestamento.

Imaginemos um cenário favorável ao crescimento da economia em taxas próximas ou superiores às previstas pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, entre 4,5% e 5% ao ano. Tal conquista supõe invevitavelmente redução de juros, maior oferta de crédito público e investimentos privados, alguma desvalorização do real e crescimento da agropecuária, que não ocorre apenas pelo aumento da produtividade, mas também da área plantada. Nesse céu de brigadeiro hipotético, será possível aos governos federal e amazônicos reduzir o desflorestamento a um patamar próximo do aceitável? De acordo com a ministra Marina, o aceitável é o desmatamento legalmente autorizado e o ideal é o desmatamento zero. Será possível ao menos manter a taxa estimada para 2006, de 13 mil km2? O que é preciso fazer para tanto?



O governo ainda não conseguiu implementar instrumentos econômicos em escala capazes de desincentivar a conversão da floresta em proveito da produção agropecuária.

Nos últimos três anos, houve inédito e louvável envolvimento nas políticas ambientais de órgãos ligados a outros ministérios que não o do Meio Ambiente (MMA), com destaque para a Polícia Federal, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e o Exército. Também é necessário destacar o volume significativamente maior de ações de fiscalização, graças ao empenho do Ibama, e o incremento substancial da criação de UCs, ainda que estejam longe de serem tiradas do papel.

Por outro lado, os governos estaduais nada avançaram na questão. A impunidade de quem comete crimes ambientais, apesar da fiscalização, ainda é a regra absoluta. No plano federal ou estadual, não se discutem metas objetivas de redução do desflorestamento. Mesmo sendo um mecanismo que ainda precisa ser testado, permitiriam o planejamento e a avaliação real do desempenho das ações do Estado.

Em reunião realizada com organizações socioambientalistas na última semana passadade outubro, logo após o anúncio dos números do desflorestamento deste ano, Marina Silva e sua equipe se comprometeram com a realização de uma avaliação, que deve acontecer nos dias 8 e 9 de novembro. Como salientou a ministra, pode-se dizer que chegamos em 2006 a um “empate” nos desmatamentos, em analogia ao movimento dos seringueiros que, na década de 1980, barrava a derrubada da floresta no Acre. Mas ainda há muito a ser feito para virar o jogo. Como superar o suposto “empate”? Só ações de comando e controle não são suficientes, principalmente se o cenário agropecuário internacional melhorar, como tem dado sinais.

Este Especial busca trazer informações, opiniões, dados e análises recentes sobre a dinâmica deste que é considerado pela sociedade brasileira como o maior problema socioambiental brasileiro - de acordo com levantamento recente promovido pelo Instituto de Estudos da Religião (ISER) - e, portanto, um dos maiores desafios para o desenvolvimento da sociedade brasileira. É a contribuição do ISA para reflexão, debates e decisões, senão em busca do desmatamento zero, ao menos do desmatamento legal na região. O desafio não é pequeno. No final da página estão os links que remetem a todas as matérias que compõem este especial

Desmatamento na Amazônia de acordo com dados do Inpe:

De 1977 a 1988: 21 mil quilômetros quadrados
De 1988 a 1990: 31,5 mil quilômetros quadrados
De 1990 a 1994: 39,7 mil quilômetros quadrados
De 1994 a1998: 77,8 mil quilômetros quadrados (1º governo FHC)
De 1998 a 2002: 76,9 mil quilômetros quadrados (2º governo FHC)
De 2002/03 a 2005/06: 84,4 mil quilômetros quadrados (governo Lula)